Em tempos de pandemia e restrições, o Caminhos do Campo retoma um assunto que é pouco discutido mesmo em tempos de fartura: o desperdício de alimentos.
O Brasil é um dos países que mais jogam comida no lixo. Agora, durante a pandemia, aumentou o número de famílias que tem recorrido a programas que doam alimentos que seriam descartados.
A Ceasa, em Curitiba, movimenta 2.800 toneladas de alimentos por dia. Boa parte destes produtos não vai para o comércio porque estão foram dos padrões de comercialização.
São frutas, legumes e verduras que não têm o tamanho padrão, estão com pontos de ferrugem, deformidades ou ainda foram amassados durante a colheita e o transporte. Estes alimentos seriam descartados porque normalmente são rejeitados pelos consumidores, em supermercados e feiras livres.
É aí que entra em ação a equipe do Banco de Alimentos da Ceasa, como explica a gerente do programa, Jaqueline Macedo.
"Vem para o Banco de Alimentos, o produto que perdeu padrão de comercialização e ainda o excedente de comércio. Estes produtos atendem uma população vulnerável em Curitiba e na região metropolitana".
Tudo vai para instituições cadastradas pelo programa, como asilos e creches, e para famílias de baixa renda.
Os funcionários do programa separam os produtos e só dispensam os que não têm mais condições de serem consumidos. Mesmo estes produtos descartados são aproveitados para a produção de bioenergia.
Neste período de pandemia, Jaqueline diz que a procura por doações cresceu muito.
"Nós chegamos a dobrar o quadro, com mais de 200 famílias atendidas e mais de 30% de procura de instituições. Essas pessoas estão na ponta da cadeia e as instituições acabam por atender essa população que foi mais atingida".
Hoje, o banco atende 115 instituições de Curitiba e Região. 250 toneladas de alimentos são doadas por mês para estas entidades sociais. Sem este trabalho, todo este alimento iria parar no lixo.
Diariamente, representes de ONGs fazem fila para coletar os donativos. Abimael de Souza, voluntário em uma delas, sabe da importância destes alimentos para as famílias que atende.
"Você vê o sorriso de uma criança quando ela recebe essa doação. Às vezes, ela não tem a fruta naquele momento. É importante o que o banco faz e nós, como voluntários, trabalhamos pelo bem estar dessas pessoas."
Palomar da Silva preside uma ONG que atende famílias pobres de Colombo, na Região Metropolitana. Ele recolhe os donativos duas vezes por semana, monta caixas individuais e distribui para 180 famílias. Ele também viu aumentar o número de pedidos de ajuda.
"Muita gente que não precisava dessas doações passou a precisar de um auxílio emergencial na área alimentar e nós, como ONG, temos tentado ajudar a todos que chegam até nós. Muitas famílias tem se alimentado só com o que a gente leva".
A nutricionista Elisa Scarpin, do Banco de Alimentos, diz que estes produtos que já estão muito maduros ou que foram amassados no transporte podem ser consumidos sem risco.
"Alimentos com casca mais rígida, como mamão ou maçã, se ele tiver só um ponto de bolor, por exemplo, é recomendado tirar até dois centímetros em volta deste ponto e consumir o resto da fruta, sem problema algum. Se estiver amassado, também não tem problema nenhum. Só tirar até dois centímetros em volta de onde estiver amassado e a gente consegue reaproveitar".
Para aproveitar ainda mais estas frutas e verduras, uma cozinha está sendo construída dentro da Ceasa.
Alguns alimentos vão ser processados e outros embalados à vácuo para aumentar a durabilidade. A previsão é que a cozinha já comece a funcionar nas próximas semanas.
Outro reforço para o Banco de Alimentos veio há dois meses, quando 28 pessoas que estão cumprindo pena e estão usando tornozeleira eletrônica começaram a trabalhar no programa.
A parceria foi possível após a assinatura de um convênio entre a Ceasa e o Departamento Penitenciário do Estado. Para Boanerges Bueno filho, chefe de produção e desenvolvimento do Depen, o convênio trouxe ganhos também para os presos porque a cada três dias trabalhados a pena é reduzida em um dia.
"Está tendo uma repercussão muito grande. A Ceasa até se surpreendeu com o trabalho e a dedicação dos presos. Por outro lado, os presos estão vendo que não estão ajudando só a eles mesmos, mas a pessoas que, muitas vezes, estão numa situação pior que a deles. Isso promove uma valorização e melhora a autoestima do grupo".
O projeto deve ser estendido agora às outras centrais de abastecimento do Paraná. Além de receber um salário mínimo, Alex Batista de Oliveira, que trabalha no programa, diz que esta é também uma oportunidade pra recomeçar.
"Este trabalho social é importante. É uma união de forças. Todo mundo tem direito a uma nova oportunidade. Agora, é focar pra frente e esquecer o que ficou pra trás. É muito bom e gratificante".