A qualidade da próxima lactação de uma vaca tem início no período seco, que é ideal que se inicie pelo menos 60 dias antes do parto. Esta fase é importante, pois é nela que ocorre a regeneração das células da glândula mamária, garantindo não só uma melhor produção, como também um colostro de melhor qualidade para a bezerra que está a caminho. O médico veterinário Alisson Chiréa destaca que períodos secos muito longos, maiores que 70 dias, tendem a aumentar a incidência de problemas metabólicos no pós-parto; “e períodos de secagem menores que 45 dias normalmente fazem com que a vaca produza menos leite na lactação subsequente – desta forma não sendo indicados”, explica o profissional.
A médica veterinária e supervisora do Fomento Leite da Copagril, Caroline Hoscheid Werle, reforça que nesta fase a vaca é submetida a uma série de alterações de metabolismo, que normalmente são consequências do desbalanço energético. No final do período seco ocorre grande aumento do crescimento fetal, comprime os órgãos ligados aos processos de digestão e compromete o espaço físico e ingestão de matéria seca. Este fato, associado com a grande variação hormonal no período pré-parto, ou seja, aumento nas concentrações sanguíneas de estrógeno e corticoides e uma queda nas concentrações de progesterona, reduz o consumo de matéria seca em até 30%.
“Este aumento no número de desordens metabólicas e digestivas acarreta uma série de problemas, como menor pico de lactação, consequentemente menor produção durante a lactação, perda de condição corporal, desempenho reprodutivo prejudicado e maior taxa de descarte no rebanho”, descreve Caroline.
E ainda, conforme Chiréa, muitos produtores com o intuito de diminuir a produção de leite no final da lactação, submetem as vacas, em especial as mais produtoras, a períodos de restrição alimentar e, eventualmente, hídrica que pode durar de 1 a 4 semanas antes de realizar o procedimento de secagem. “Este manejo é conhecido como secagem gradual. Obviamente, restringir água ou alimentos no período pré-secagem causa um grande estresse no animal e, portanto, este tipo de manejo não é recomendado por inúmeros motivos de ordem fisiológica”, alerta.
Secagem
Alguns pontos, como conforto, balanço nutricional e manejo adequado da vaca, principalmente nos 60 dias que antecedem o parto, são importantes para garantir o sucesso tanto na fase inicial da vida da bezerra, como da lactação da vaca. “Em geral, o processo de secagem deve ser efetuado de forma rápida, associado à utilização de antibióticos intramamários específicos para vacas secas em conformidade com a duração do período seco de forma a evitar resíduos de antibióticos após o parto. O antibiótico utilizado também deve ser adequado para tratar os principais tipos de infecções que ocorrem no rebanho – isso é importante pois cada grupo tende a ter uma característica quanto aos patógenos mais comuns em vacas contaminadas”, comenta Chiréa.
Quando falamos de conforto da vaca pré-parto devemos levar em consideração as instalações com número elevado de animais por metro quadrado, condição de temperatura, acesso a água e alimentos, ventilação, entre outros.
A condição corporal das vacas também é fundamental durante o período seco e os animais geralmente são classificados de 1 (vacas extremamente magras) a 5 (vacas extremamente gordas). Sabe-se que animais mais gordos diminuem sua ingestão de matéria seca muito antes em relação ao parto que animais com condição corporal mais ideal. “Estas mesmas vacas mais gordas têm claramente mais problemas metabólicos no pós-parto e sua fertilidade, em termos de taxa de concepção, é muito pior, principalmente para vacas que perdem mais peso nas primeiras semanas após o parto” explica o médico veterinário Chiréa.
Estratégias
Caroline explica que existem diversas estratégias para reduzir o estresse pré-parto. Dentre elas destacam-se a formação de lotes, o monitoramento do escore de condição corporal (ECC) e adoção de dietas aniônicas.
Formação de lotes
Formação de lotes de vacas em final de gestão, que estejam entre 60 a 30 dias antes do parto. Dos 30 dias ao parto, o produtor deve transferi-las para um piquete maternidade que permita uma maior observação.
Vacas no início do período seco podem ser alimentadas com pastagem de boa qualidade, feno de boa qualidade, silagem ou combinações destes.
Neste piquete, o produtor deve estar atento aos sinais de proximidade do parto, que são:
- 2 a 3 semanas pré-parto, ocorre aumento do úbere. Em vacas de primeira parição, isto pode acontecer um pouco mais cedo.
- 2 a 3 dias antes do parto os tetos se enchem e perdem a rugosidade. Ocorre relaxamento dos ligamentos e músculos da pelve e da cauda.
- Mais próximo ao parto, ocorre liberação de muco viscoso pela vagina. A vulva fica edemaciada. Ocorre produção e liberação de colostro.
Monitoramento de Escore de Condição Corporal (ECC)
Numa escala de 1 a 5 pontos, idealmente as vacas deveriam parir com um ECC de 3,50 a 3,75. Embora pequenos ajustes possam ser feitos, o ECC deve ser mantido durante o período seco. Vacas que parem com um ECC superior a 3,75 apresentam maior propensão a cetose, febre do leite e deslocamento do abomaso e, de maneira geral, apresentam menor apetite.
Adoção de dietas aniônicas para vacas no pré-parto
Muito utilizadas por diversos produtores, as dietas pré-parto ou aniônicas têm o objetivo de tornar negativo o balanço catiônico aniônico da dieta (DCAD), através da inclusão de sais aniônicos.
Dietas que possuem altas concentrações de sódio e potássio resultam em alcalose metabólica, diferente do que se busca em uma dieta aniônica. Uma leve acidose metabólica dias antes do parto é desejada devido à ativação do paratormônio, que promove a absorção de cálcio quando o nível se encontra abaixo do necessário na circulação sanguínea. A redução dos níveis de cálcio no sangue acarreta no surgimento de hipocalcemias clínica ou subclínica.
Um ponto importante neste período é o baixo consumo de matéria seca pelos animais. Desta forma, é importante garantir o consumo do núcleo aniônico ou concentrado para que a dieta seja eficiente.
Saúde
Durante a “pausa” entre lactações, a glândula mamária passa por um processo bastante ativo, a nível celular e endócrino, de involução e posterior renovação de tecido glandular para a próxima lactação. Vacas com maiores produções de leite no momento da secagem são mais propensas a se contaminarem com microrganismos causadores de mastite. “Maiores produções de leite no momento da secagem induzem mais edema, dor e casos de vazamento de leite, que podem afetar mais de 40% das vacas sob certas condições de manejo, atrasando a formação do tampão de queratina no canal do teto, o que representa uma importante via de contaminação do úbere”, exemplifica Chiréa.
Atualmente no Brasil, também existem estratégias e apresentações farmacológicas que podem diminuir problemas relacionados ao vazamento e mesmo ao excesso de edema do úbere pós-secagem. Como é o caso de selantes de teto e facilitador de secagem a base de cabergolina que diminui as concentrações de prolactina e ajuda com os problemas de vazamento de leite pós-secagem e diminui a chance de contaminação por bactérias e outros patógenos invasores.
Uma série de ferramentas e técnicas estão atualmente disponíveis aos produtores e veterinários para melhorar a condição da vaca durante a secagem e período seco. Os profissionais da Copagril e parceiros estão à disposição para esclarecer as dúvidas e orientar sobre as melhores práticas de manejo.
*Matéria divulgada na Revista Copagril Edição 115 (março/abril). Você pode conferir o conteúdo original em: https://www.copagril.com.br/revista/85.